quinta-feira, 18 de julho de 2013

Extração de ouro ao lado de Belo Monte pode ser liberada

A companhia canadense Belo Sun, que pretende extrair milhares de toneladas de ouro aos pés da barragem da hidrelétrica de Belo Monte, que está em construção no rio Xingu, obteve avaliação positiva de viabilidade ambiental do projeto. A análise técnica foi realizada pela Secretaria do Meio Ambiente (Sema) do Pará.
Uma minuta da licença prévia ambiental para o chamado "Projeto Volta Grande" já está pronta e uma lista de compensações que terá de ser executada para tocar o empreendimento também foi elaborada pela secretaria.
A informação foi confirmada pela gerente de mineração da Sema no Pará, Mariana Queiroz. "O setor técnico concluiu que existe viabilidade ambiental do projeto, com base em algumas condicionantes", disse ao Valor. Ela não detalhou que condicionantes são essas, nem qual o valor da compensação pelo impacto do empreendimento.
Com o aval dos analistas ambientais, o projeto aguarda avaliação jurídica. A reportagem tentou conversar com o responsável por essa área na Sema, mas não teve retorno. Uma vez aprovado no departamento jurídico, bastará apenas que o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Coema) sacramente o licenciamento.
As intenções dos canadenses com o Xingu não são modestas. A Belo Sun, que pertence ao grupo Forbes&Manhattan, um banco de capital fechado que desenvolve projetos de mineração, quer investir US$ 1,1 bilhão na extração e beneficiamento de ouro nas margens do rio.
A produção prevista, segundo o relatório de impacto ambiental da empresa, é de 4.684 quilos de ouro por ano, o que significa um faturamento anual superior a R$ 500 milhões. O maior problema é que todo esse ouro deverá ser retirado a apenas 17 km de distância na barragem de Belo Monte.
Consórcio Norte Energia, que constrói uma usina no rio Xingu, teme o acirramento da questão ambiental na região
Para o consórcio Norte Energia, que há três anos enfrenta todo tipo de conflito para levar adiante a construção de sua hidrelétrica, a exploração de ouro na região é uma dor de cabeça a mais, porque pode potencializar os desentendimentos com indígenas e ribeirinhos, uma confusão que, na realidade, o consórcio nunca conseguiu dar fim.
A Belo Sun alega que não há risco de abalo sísmico que comprometa a barragem da usina, por conta dos explosivos que vai usar nas margens no Xingu. Argumenta também que não vai minerar diretamente no leito do rio e que terá todo cuidado com a utilização diária de milhares de litros de cianeto.
O projeto prevê a manipulação de 37,8 milhões de toneladas de minério tratado nos onze primeiros anos de exploração da mina. As previsões são de que essa exploração avance por até 20 anos.
A condução do licenciamento ambiental do projeto pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará é uma polêmica à parte, não apenas pelo porte do empreendimento em questão - segundo a Belo Sun, será o maior projeto de exploração de ouro do Brasil -, mas também pela sinergia que ele possui em relação a Belo Monte, usina que passa pelo crivo federal do Ibama.
A Fundação Nacional do Índio (Funai), um órgão interveniente do processo de licenciamento ambiental, chegou a enviar uma solicitação ao Ibama para que o processo passe a ser federalizado, mas o órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente alegou que, por razões técnicas, o licenciamento realmente deveria ser tocado pela Sema.
A questão indígena, isoladamente, é outro obstáculo ao projeto. Procurada pelo Valor, a Funai informou que, no processo de licenciamento conduzido pela secretaria do Pará, "a Funai não foi consultada pelo órgão ambiental, sendo que os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) foram realizados de maneira insuficiente para avaliação dos impactos sobre as terras e povos indígenas da região".
A Belo Sun alega que, pelas regras do país, só é necessário fazer estudo sobre índios no processo de licenciamento se o empreendimento está localizado a menos de 10 km de terras indígenas. Segundo a empresa, as duas aldeias mais próximas estão a 12 km e 17 km da mineração. A Funai, no entanto, informou ao Valor que, depois de fazer uma análise cartográfica, constatou a possibilidade de impactos às terras indígenas Paquiçamba, Arara da Volta Grande do Xingu e na área com restrição de direito de ingresso denominada Ituna-Itatá, onde se tem notícia de presença de índios isolados, bem como aos moradores indígenas da região da Volta Grande, como a Ilha da Fazenda e demais localidades. Segundo a Funai, a falta de mais informações impede a liberação do licenciamento. "Não há, por enquanto, anuência da Funai para continuidade do processo."
O projeto é acompanhado de perto pelo Ministério Público Federal (MPF) do Pará, que aguarda informações sobre o a questão indígena desde setembro do ano passado. Pelas regras do licenciamento ambiental, qualquer licença, seja estadual ou federal só pode avançar se tiver a anuência de demais órgãos que compõe o rito ambiental, como a Funai, a Fundação Palmares e o Instituto Chico Mendes (ICMBio).
"Até hoje aguardamos a resposta sobre nossos questionamentos. Não nós deram retorno", diz a procuradora do MPF, Thais Santi Cardoso da Silva. "A avaliação do projeto deve incluir um posicionamento da Funai, que é anterior à emissão da licença. É inaceitável que qualquer processo avance sem a manifestação prévia da Funai."
O projeto da Belo Sun prevê a realocação de 250 famílias para uma nova vila, onde está prevista a construção de diversas estruturas, entre elas uma escola, uma creche, um posto de saúde e três igrejas.

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