O estudo de impacto
ambiental pressupõe o controle preventivo de danos ambientais. Uma vez
constatado o perigo ao meio ambiente, deve-se ponderar sobre os meios de
evitar ou minimizar o prejuízo. A Lei n. 6.938/81 estabeleceu a
“avaliação dos impactos ambientais” (art. 9º, III) como instrumento da
Política Nacional do Meio Ambiente.
A Constituição Federal
de 1988 determinou em seu art. 225, § 1º, IV, que incumbe ao Poder
Público “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”. Nesse
estudo, avaliam-se todas as obras e todas as atividades que possam
causar séria deterioração ao meio ambiente.
O Decreto n. 88.351/83
(art. 18, § 1º) determinou ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)
que fixasse os critérios básicos e as diretrizes gerais para estudos de
impacto ambiental para fins de licenciamento de obras e atividades. A
Resolução n. 1/1986 do CONAMA tratou dessa matéria.
Compreende-se como
impacto ambiental qualquer deterioração do meio ambiente que decorre de
atividade humana. A Resolução n. 1/86 do CONAMA, em seu art. 1º,
considera impacto ambiental “qualquer alteração das propriedades
físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer
forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que direta
ou indiretamente afetam:
I – a
saúde, a segurança e o bem-estar da população;
II – as
atividades sociais e econômicas;
III – a
biota;
IV – as
condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
V – a
qualidade dos recursos ambientais”.
O art 2º
da Resolução n. 1/86 do CONAMA estabelece um rol exemplificativo de
atividades modificadoras do meio ambiente que dependem obrigatoriamente
da elaboração do estudo de impacto ambiental para seu licenciamento como
estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento, ferrovias,
oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de
esgotos sanitários e linhas de transmissão de energia elétrica, acima de
230KV.
O estudo
de impacto ambiental tem origem no Direito Norte-americano em virtude de
exigência de elaboração de um relatório de impacto do meio ambiente, a
partir de 1969, a ser apresentado juntamente aos projetos de obras do
governo federal que causassem sensível alteração na qualidade do meio
ambiente. Como ensina José Afonso da Silva, o estudo prévio de impacto
ambiental deve ter como objetivo compatibilizar o desenvolvimento
econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do
equilíbrio ecológico, tendo em vista constituir um dos principais
objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81, art. 4º,
I)[1].
O objeto
desse estudo prévio consiste em avaliar todas as obras e atividades que
possam acarretar alguma deterioração significativa ao meio ambiente,
seja um dano certo ou incerto.
Além de
atender aos princípios e objetivos da Lei de Política Nacional do Meio
Ambiente, o estudo de impacto ambiental (EIA) deverá ter como diretrizes
gerais:
I - Contemplar todas as
alternativas tecnológicas e de localização de projeto, confrontando-as
com a hipótese de não execução do projeto;
II - Identificar e
avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de
implantação e operação da atividade;
III - Definir os
limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos
impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em
todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza;
IV - Considerar os
planos e programas governamentais, propostos e em implantação na área de
influência do projeto, e sua compatibilidade. (Resolução n.1/86, art.
5º).
A
avaliação do risco, a grandeza do impacto e a análise do grau de
reversibilidade do impacto ou a sua irreversibilidade estarão contidos
nesse estudo. Diagnosticados esses dados, o próprio EIA indicará
providências para evitar ou atenuar os impactos negativos inicialmente
previstos, juntamente com a elaboração de um programa de acompanhamento
e monitoramento destes.
Esse
estudo preventivo está intimamente ligado ao denominado licenciamento
ambiental. Entende-se por licenciamento ambiental o processo
administrativo pelo qual o órgão ambiental competente analisa a
localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e
atividades que utilizem recursos ambientais e que possam efetiva ou
potencialmente poluir ou degradar o meio ambiente. Esse processo está
disciplinado pela Resolução CONAMA n. 237/97.
Em qualquer das fases
do licenciamento ambiental poderá ser elaborado o estudo prévio de
impacto ambiental e o seu respectivo relatório (EIA/RIMA).
Saliente-se que o EIA
não vincula obrigatoriamente a decisão a ser tomada pela Administração
Pública nesse licenciamento ambiental, uma vez que esse estudo não
fornece uma resposta absoluta e inquestionável sobre os danos que possam
surgir. A necessidade de interpretação do conteúdo do estudo se
apresenta imprescindível, tendo em vista a importância de analisar a
conveniência e oportunidade em autorizar o projeto do proponente, assim
como disponibilizar as soluções possíveis para afastar ou reduzir a
magnitude dos diversos impactos ambientais negativos.
Desta forma, o
deferimento de licença ambiental, ato final do licenciamento, será
possível mesmo que o estudo de impacto ambiental seja desfavorável[2].
O fundamento para essa discricionariedade nas mãos da Administração
Pública para licenciar ou não determinada obra ou atividade apesar da
produção de significativos efeitos negativos ao meio ambiente se
encontra no equilíbrio que deve existir entre o desenvolvimento
econômico sustentável e a proteção ao meio ambiente. Caberá ao Poder
Público avaliar a concessão ou não da licença ambiental nessa
conjuntura, ponderando o princípio do desenvolvimento sustentável,
preceito de preservação do meio ambiente, frente ao desenvolvimento da
ordem econômica. Como não poderia ser diferente, perante o princípio da
motivação, cabe ao Poder Público apresentar os fundamentos dessa decisão
para fins de controle.
Por outro lado, a
apresentação de um EIA/RIMA favorável vincula o órgão público a conceder
a licença ambiental, uma vez que, sendo a defesa do meio ambiente
condicionadora da livre iniciativa, nos termos do art. 170, VI, da CF,
não existindo nenhuma forma de prejuízo ao bem ambiental, não haverá
justificativa para impedir a realização da obra ou atividade.
O relatório de impacto
ambiental (RIMA) tem como finalidade esclarecer à população interessada
qual o conteúdo do estudo de impacto ambiental, uma vez que este
documento é elaborado em termos técnicos. Este relatório é praticamente
um dever, tendo em vista o princípio da informação ambiental. Uma vez
elaborado, o EIA/RIMA deverão ser dirigidos ao órgão ambiental para que
se proceda ao deferimento da licença ambiental ou não.
A elaboração do estudo
de impacto ambiental deve ficar a cargo de uma equipe multidisciplinar
formada por técnicos nos diversos setores necessários para uma completa
análise dos impactos ambientais positivos e negativos do projeto, para
confecção de um estudo detalhado sobre a obra ou atividade.
A Resolução CONAMA 1/86
em seu art. 7º originalmente previa a elaboração do estudo prévio de
impacto ambiental por uma equipe não dependente direta ou indiretamente
do proponente do projeto, e ressalvava que este seria responsável
tecnicamente pelos resultados apresentados. Constata-se uma tentativa de
conferir independência ao trabalho desenvolvido.
A Resolução CONAMA n.
237/97, entretanto, revogou o art. 7º da resolução mencionada e passou a
dispor no seu art. 11 que: “os estudos necessários ao processo de
licenciamento deverão ser realizados por profissionais legalmente
habilitados, às expensas do empreendedor”.
O parágrafo único deste
art. 11 determina ainda que o empreendedor e os profissionais que
subscrevem os estudos previstos serão responsáveis pelas informações
apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais.
Entende-se que apenas a
responsabilidade objetiva existente no sistema normativo federal em
termos de dano ambiental, não será suficiente para garantir
impessoalidade neste trabalho. Faz parte da cultura nacional a
necessidade de controles formais e mecanismos preventivos para conferir
a segurança e independência técnica adequada para a importante função
que será desempenhada pela equipe em questão[3].
Para concluir,
sempre é interessante alertar que os instrumentos de realização dos
princípios da prevenção e da precaução, como é o caso do Estudo de
Impacto ambiental e seu relatório, não têm por finalidade impedir o
desenvolvimento de atividades econômicas e sociais.
O controle preventivo realizado por
esse instrumento é de fundamental importância, pois requer uma atuação
conjunta do Poder Público, da sociedade civil e da comunidade
científica, que devem se harmonizar em um objetivo único: aliar o
desenvolvimento social e econômico à preservação do meio ambiente e da
própria espécie humana. Para isso, faz-se necessário o princípio da
participação. Todo cidadão deve ter acesso a informações ambientais e
participar do processo de tomada de decisões por parte do Estado. Como
alerta Paulo Affonso Leme Machado, “a prática dos princípios da
informação ampla e da participação ininterrupta das pessoas e
organizações sociais no processo das decisões dos aparelhos burocráticos
é que alicerça e torna possível viabilizar a implementação da prevenção
e da precaução para a defesa do ser humano e do meio ambiente”.[4]
É o cidadão, em primeiro lugar, que deve se manifestar se aceita
suportar eventual risco que se verifica em determinado empreendimento.
[1] SILVA,
José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo:
Malheiros Editores Ltda, 1994, p. 197.
[2]
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco.
Curso de direito ambiental brasileiro.
6. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 82.
[3] Nas
palavras de Paulo Affonso Leme Machado, “ Os Estados brasileiros têm
o direito de instituir normas legais que disciplinem a equipe
multidisciplinar de forma mais exigente do que aquela contida na
Resolução do CONAMA. O Estado do Rio Grande do Sul disciplinou a
matéria da seguinte forma: Art. 74. O estudo prévio de impacto
ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), serão
realizados por equipe multidisciplinar habilitada, cadastrada no
órgão ambiental competente, não dependente direta ou indiretamente
do proponente do projeto e que será responsável tecnicamente pelos
resultados apresentados, não podendo assumir o compromisso de obter
o licenciamento do empreendimento. § 1º. A empresa executora do EIA/RIMA
não poderá prestar serviços ao empreendedor, simultaneamente, quer
diretamente, ou por meio de subsidiária ou consorciada, quer como
projetista ou executora de obras ou serviços relacionados ao mesmo
empreendimento objeto do estudo prévio de impacto ambiental. § 2º.
Não poderão integrar a equipe multidisciplinar executora do EIA/RIMA
técnicos que prestem serviços, simultaneamente, ao empreendedor
(Código Estadual do Meio Ambiente) ”. MACHADO, Paulo Affonso Leme.
Direito Ambiental Brasileiro. 13ª ed. São Paulo, Malheiros
Editores, 2005, p.240.
[4] MACHADO,
Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 13ª ed. São
Paulo, Malheiros Editores, 2005, p.80.
Advogado da União,
Mestre em Direito do
Estado pela UFPR,
Professor de
Direito Administrativo da Faculdade de Direito de Curitiba, da Escola da
Magistratura Federal do Paraná e do Curso Jurídico. Autor do Livro
“Manual de Direito Administrativo”, 1ªed., 2ª Tiragem - Editora Fórum –
2005.
www.marcusbittencourt.com.br
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