Água é sinônimo de vida. A ingestão de
água nos garante a boa qualidade vida. Contudo, quase 4,6
milhões de crianças com menos de cinco anos, em paises
pobres, morrem de doenças decorrentes de veiculação hídrica,
anualmente. O abastecimento com água potável e o saneamento
ambiental poderiam reduzir em 75% as taxas de mortalidade e
enfermidades no mundo. Mesmo no Brasil, 50.000 bebês/ano
morrem de diarréia e as doenças associadas à água de baixa
qualidade correspondem a 65% dos casos de internações
hospitalares.
Os esforços empreendidos na melhoria das
condições sanitárias dos países pobres têm se mostrado
insuficientes para amenizar esse cenário social, agravado por
séculos de descaso dos governantes, e que piora em função do
crescimento populacional. Segundo o Fundo Mundial da
Natureza (WWF), por volta de 2008, 60% da humanidade não
disporá mais de água potável, uma vez que o ritmo de consumo
dobra a cada 25 anos.
Parece uma incoerência especular-se sobre
a falta de água num planeta cuja superfície é constituída
por 75% dela. Entretanto, apenas 3% da água disponível é
adequada ao consumo humano (não salgada), sendo que 2% estão
sob a forma das calotas polares. Deste 1% apenas 3%
concentram-se nos rios e lagos, sendo o Brasil um dos países
com maior riqueza hídrica no mundo. O restante 97%
encontra-se em subsuperfície.
Com a crescente industrialização,
urbanização e a tecnificação da agricultura, os recursos
hídricos de superfície estão rareando em vista do elevado
consumo e pela contaminação de mananciais, suscitada pela
expansão não planejada da população. Desta forma, as atenções
vêm-se convergindo para essa outra fonte de abastecimento,
não tão visível, mas igualmente importante: as águas
subterrâneas.
No mundo, 1,5 bilhão de pessoas dependem
das águas subterrâneas. Estima-se que, na América Latina, 150
milhões utilizam o recurso. Focalizando o caso do Brasil
(detentor de 8% das águas doces do mundo), calcula-se que
existam 112 bilhões de m3 de água subterrânea. Por volta de
35 a 40% da população brasileira deve fazer uso do recurso
subterrâneo.
No Estado de São Paulo, estima-se que 74%
dos núcleos urbanos sejam total ou parcialmente abastecidos
por fontes subterrâneas. Mesmo na Bacia do Alto Tietê (Região
Metropolitana de São Paulo), onde os recursos são bastante
modestos, avalia-se que aproximadamente 7,9 m3/s (249Mm3/a)
sejam explorados de 6-7 mil poços tubulares em operação, de
um total de mais de 10 mil poços perfurados (dados de 2000).
Essa vazão representa 15% do abastecimento público da Bacia.
O ciclo hidrológico (Figura 1) consiste
no intercâmbio entre os reservatórios oceanos, geleiras,
rios, lagos, vapor d?água da atmosfera, águas subterrâneas e
água retida nos seres vivos, e que é movimentado pela energia
solar, representando o processo mais importante da dinâmica
externa terrestre.
Deve-se
ter em mente que a água não se perde do sistema, mas sempre
se conserva. No entanto, a dinâmica do ambiente é complexa
porque é regida desde fatores meteorológicos, como o vento,
chuva, insolação, até pela ação antrópica que, além
de modificar a paisagem, provoca distúrbios no clima. Assim, a
água pode evaporar-se de um lugar já árido, e se precipitar
nos oceanos, ou ainda, enquanto inunda cidades, causa déficit
em represas ou em áreas famintas de irrigação.
O balanço hídrico determina o equilíbrio
da entrada e da saída da água dentro de uma bacia
hidrográfica. A entrada corresponde principalmente à
precipitação. A compensação ocorre na saída por meio da
infiltração no solo, escoamento superficial, evaporação,
evapotranspiração, variação no conteúdo de umidade no solo ou
armazenamento do reservatório subterrâneo e a exploração
da água para o consumo.
A precipitação pode ocorrer na forma de
chuva, granizo, neve ou orvalho. A taxa de transferência de
água da fase líquida para a de vapor é definida como
evaporação, a qual atua sobre as águas superficiais, a
umidade do solo e os tecidos das plantas, tomando nos dois
últimos casos a denominação de evapotranspiração.
As águas que porventura infiltram-se podem ficar
retidas nos poros pela tensão capilar (superficial) exercida
entre grãos e o ar presentes no solo, o que implicará na
variação de armazenamento ou umidade nessa zona conhecida
como não saturada, ou serem drenadas pela gravidade em
direção a uma zona cujos poros encontram-se totalmente cheios
de água (zona saturada). A rocha ou sedimento que permite o
armazenamento e a exploração da água é conhecida como
aqüífero. Este fenômeno que faz com que a água atinja a zona
saturada é conhecida como recarga do aqüífero.
Quando a precipitação supera a
infiltração no solo ou quando a água atinge uma formação
impermeável, como argilas, a água passa a escoar na
superfície. Em seu percurso, estará sujeita, então, à
evaporação, à infiltração em outro material mais permeável
ou à descarga em corpos d'água, alimentando os rios e
lagos.
Segundo as suas características hidráulicas, há
basicamente dois tipos de aqüífero: o livre e o confinado
(Figura 2). No primeiro caso, o aqüífero estará em
contato direto com a pressão atmosférica. Já o aqüífero
confinado, como o próprio nome diz, encontra-se delimitado
por camadas litológicas menos permeáveis, em cujo interior a
água está submetida a uma pressão maior que a atmosférica.
Embora a água subterrânea seja um recurso
menos susceptível aos impactos da atividade antrópica
comparativamente ao manancial superficial, há dois problemas
que podem afetá-la: a contaminação e a super-exploração.
A contaminação ocorre pela ocupação
inadequada de uma área que não considera a sua
vulnerabilidade, ou seja, a capacidade do solo em degradar as
substâncias tóxicas introduzidas no ambiente. A contaminação
pode se dar por fossas sépticas e negras; infiltração de
efluentes industriais; fugas da rede de esgoto e galerias de
águas pluviais; vazamentos de postos de serviços;
contaminação por água salina advinda do mar em aqüíferos
costeiros, por aterros sanitários e lixões; uso indevido de
fertilizantes nitrogenados; entre outros.
Já a super-exploração ocorre quando a
extração de água subterrânea ultrapassa os limites de
produção do aqüífero, provocando danos ao meio ambiente ou
para o próprio recurso, como aumento nos custos de
bombeamento, escassez de água, indução de água contaminada e
problemas geotécnicos de subsidência (compactação
diferenciada do terreno, causando o colapso de construções
civis).
Tanto a super-exploração como a
contaminação de solos e aqüíferos podem ser evitadas. A
partir de estudos prévios, é possível estimar as vazões
máximas que poderão ser extraídas de uma nova captação,
sem que cause danos aos poços vizinhos. Da mesma forma, avaliações
específicas podem mostrar se novas atividades antrópicas
causarão algum problema ao aqüífero. Cabe aos órgãos
de governo, com participação da população, definir as
políticas para o bom manejo do recurso, para que este seja
utilizado de forma sustentável e que possa promover o bem
estar e o desenvolvimento econômico da sociedade.
Do IGC da USP
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