O mês de setembro reforçou a tese dos pesquisadores das mudanças
climáticas, de que em menos de 100 anos o aquecimento global modificará o
ambiente planetário. Duas entidades internacionais divulgaram
diagnósticos neste mês que apontam para tal entendimento, segundo o
coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) da
Criosfera, Jefferson Simões. O Centro Nacional de Neve e Gelo (NSIDC),
dos Estados Unidos, e o Painel Intergovernamental para Mudanças do
Clima, da Organização das Nações Unidas (IPCC/ONU), ambas as siglas no
idioma inglês.
De acordo com dados do centro, no dia 13 de setembro de 2013, a
extensão do gelo marinho no Oceano Ártico foi contabilizada com 5,10
milhões de km2. "Esta é a extensão mínima do ano. Se compararmos com o mínimo do ano passado de 3,2 milhões de km2,
essa medição corresponde a um aumento de quase 60%, porém, foi a sexta
menor área de gelo marinho nos últimos 34 anos", explica Simões,
especialista dos temas polares.
Para compreender este processo sazonal é importante conhecer ocicio
climático da região. A extensão do gelo no Oceano Ártico aumenta a cada
inverno e diminui a cada verão, por conta da variação no aporte da
radiação proporcionada pelo Sol. Considerando este fator, todos os anos a
cobertura registra seu ponto mínimo em setembro, pouco depois do
período mais quente do ano, oque é um fenômeno natural, mas os baixos
índices médios registrados nos últimos anos são inéditos.
Ratificando
a afirmação anterior sobre o impacto do aquecimento global no Ártico, o
coordenador do INCT Criosfera lembra que no dia 27 de setembro, o
painel da ONU divulgou a estimativa de que o planeta sofrerá um aumento
da temperatura média global de no mínimo 1,5 graus Celsius até o final
do século. "Este aumento não será homogêneo e na região do Ártico poderá
facilmente ultrapassar 3°C", pondera.
Ele explica que a diminuição da cobertura de gelo do Oceano Ártico
decorre do aumento da temperatura atmosférica. "Independente da origem, o
que sabemos e é o mais importante, é que não temos registro desse
fenômeno nos últimos 500 anos e aumentando a temperatura é provável que
não tenhamos mais gelo marinho no verão polar até 2040", alerta.
O aquecimento da atmosfera acima do Ártico é um dos mais rápidos no
mundo. Com o aumento da temperatura, o gelo do mar derreterá e mais
energia solar será absorvida pelas águas do oceano. Uma área coberta de
neve e gelo reflete 80% da energia recebida do sol, se eles
desaparecerem o mar refletirá somente 20% desta energia.
"Além disso, o gelo marinho é um bom isolante térmico, pois não
permite a troca de energia entre o oceano e a atmosfera. Removendo o
gelo marinho essa troca de energia torna-se mais eficiente e,
conseqüentemente, continuará propiciando a elevação da temperatura da
região e mudará o padrão das correntes oceânicas superficiais árticas",
destaca Simões.
Ainda é difícil prever quais as conseqüências do fenômeno na escala
global, mas para a biodiversidade a previsão é negativa. "A teia
alimentar ártica, basicamente marinha, é modificada com o
desaparecimento do mar congelado. Corta rotas de migração de mamíferos
que vivem na superfície e muda o aporte de radiação na camada
superficial do oceano, afetando a produtividade de microorganismos, base
da teia alimentar. A floresta boral já mostra os primeiros sinais de
expansão para o Norte, avançando sobre o bioma Tundra", descreve.
"Não devemos esquecer também o impacto dessas rápidas modificações
para as comunidades autóctones, como os Inuits conhecidos popularmente
por esquimós, que tem seu modo de vida baseado na caca e pesca ártica",
lembra.
Ártico
A medição no gelo marinho do Ártico é referência para as mudanças
climáticas mundiais, por ser um controle pioneiro e por ter continentes
no seu entorno, o que aumenta a influência das ações humanas na região.
Embora pareça isolado do restante do mundo, o oceano que rodeia o Polo
Norte geográfico afeta todo oplaneta.
As mudanças climáticas que lá estão mais evidentes podem já no curto
prazo, acentuar eventos climáticos extremos como secas e chuvas fortes.
"Essa rápida redução do gelo marinho ártico surpreendeu a comunidade
científica, pois as previsões indicavam que tal redução só ocorreria em
algumas décadas", observou.
O grupo coordenado por Simões pretende elevar a quantidade dos
projetos de pesquisa neste ambiente. "No Ártico, por enquanto, só
monitoramos a situação do gelo marinho no INCT. Existe a intenção de
fazer a primeira expedição cientifica nacional ao ártico no verão de
2016/2017. Ainda não definimos para qual parte do território iremos, mas
as pesquisas serão relacionadas à investigação de testemunhos de gelo,
que provêem o melhor registro da história climática existente", opina.
Geopolítica
A redução da área coberta por mar congelado começa a permitir a
navegação através de uma passagem entre a Europa e a Ásia, via Norte da
Sibéria. Essa seria a passagem do Nordeste, tão sonhada desde a época
dos Grandes Descobrimentos, pois reduziria a rota marítima em milhares
de quilômetros e facilitaria a exploração dos recursos minerais na
Sibéria.
"Em particular, facilita a exploração de recursos como o óleo e o gás
na costa e plataforma continental norte-americana e siberiana",
enfatiza Simões. "Esse, inclusive, é o motivo básico das diferentes
ações russas ao longo dos últimos anos, para reforçar sua soberania no
alto ártico, inclusive para estender sua plataforma continental conforme
permite a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar",
finaliza.
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