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segunda-feira, 22 de julho de 2013

O Meio Interestelar

Orion Nebula Egg Hour Glass Horse Nebula
Embora a maior parte da massa da nossa galáxia esteja concentrada em estrelas, o meio interestelar não é completamente vazio. Ele contém gás e poeira, na forma de nuvens individuais, e também em um meio difuso. O meio interestelar contém tipicamente um átomo de hidrogênio por centímetro cúbico e, aproximadamente, 100 grãos de poeira por quilômetro cúbico.
Roseta
Imagem composta da Nebulosa da Roseta obtida por ©Ignacio de la Cueva Torregrosa. Os glóbulos de gás e poeira estão sendo erodidos pela luz e vento de estrelas massivas próximas. O filtro vermelho está centrado na linha do enxofre, o verde no hidrogênio e o azul no oxigênio. A nebulosa tem cerca de 50 anos luz de extensão e está a aproximadamente 4500 anos-luz de distância.
O meio interestelar compreende todo o material entre as estrelas. A grande parte do gás é composta de hidrogênio, a poeira é composta principalmente de grafite, silicatos e gelo de água, em grãos de vários tamanhos, mas muito menores (da ordem de 1 micrometro) do que a poeira aqui na Terra.
poeira
Aproximadamente 10% da massa da Via Láctea, nossa galáxia, está na forma de gás interestelar e a poeira agrupa menos de 1% da massa em gás. Raios cósmicos, que são partículas altamente energéticas, estão misturados com o gás e a poeira. Existe também um campo magnético galático, fraco (10 \muG).
Horse Head
Regiao
No centro da foto vemos a nebulosa escura da Cabeça de Cavalo, enquanto na esquerda vemos a Nebulosa de Órion, na espada da constelação do Órion. Trata-se de uma região de formação estelar, onde as estrelas mais massivas formam o Trapézio. A nebulosa de Órion está a 1500 anos-luz de nós, tem 25 anos-luz de diâmetro, uma densidade de 600 átomos/cm3 e temperatura de 70K. A foto colorida é do ©Star Shadows Remote Observatory.
horse
Detalhe da Cabeça de Cavalo obtida pelo Telescópio Espacial Hubble.
Orion Trifid
Detalhes da Nebulosa de Órion e da Trifid.
Caranguejo
Duas fotos da Nebulosa do Caranguejo, os restos de uma supernova cuja explosão foi observada no ano 1054 e está a 7000 anos-luz, na constelação do Touro. No seu centro está o pulsar, girando 30 vezes por segundo.
GEMS Orion Reflexão
Imagem da nebulosa de Órion obtida com o GEMS (sistema de ótica ativa multiconjugada) do telescópio Gemini sul e uma nebulosa de relexão no Órion.
A quantidade de gás do meio interestelar diminui continuamente com o tempo pois novas gerações de estrelas se formam a partir do colapso de nuvens moleculares gigantes.
Barnard 68 Barnard 68
Foto da nuvem molecular Barnard 68 que está a 500 anos-luz da Terra, na direção da constelação de Ofiúco, com cerca de meio ano-luz de diâmetro e com uma temperatura de -263C e está colapsando. A foto da esquerda foi obtida com o telescópio de 8,2 do European Southern Observatory, no ótico. À direita está a foto em cor falsa obtida no telescópio de 3,5m do European Southern Observatory, composta de três exposições no infravermelho, em 1,25, 1,65 e 2,16μm
O colapso e fragmentação destas nuvens dão origem a cúmulos estelares, que são agrupamentos de estrelas todas a aproximadamente a mesma distância e de mesma idade.
m.jpg
Os cúmulos estelares se dividem em cúmulos abertos, que contêm centenas a poucos milhares de estrelas, e cúmulos globulares, como este da foto, e contêm milhares a centenas de milhares de estrelas. Os cúmulos abertos estão no disco da nossa galáxia, enquanto os globulares estão no bojo.
Como a função inicial de massa de formação estelar favorece fortemente a formação de estrelas de baixa massa (para cada estrela de massa de 10 massas solares, centenas de estrelas de massa entre 0,5 e 1 massa solar são formadas), e as estrelas de baixa massa perdem muito pouco de sua massa em sua evolução, cada nova geração de estrelas aprisiona o gás do meio interestelar. O hidrogênio neutro (HI) emite uma linha espectral no comprimento de onda de 21 cm, que é usada para mapear a distribuição desse gás e que teve um papel chave na determinação da estrutura espiral da Galáxia.
braços
Mapa da distribuição de hidrogênio na nossa Galáxia. O centro da Galáxia está indicado por um pequeno círculo azul.
Especificamente, os spins (sentido de rotação) do elétron e do próton, no hidrogênio neutro em seu estado fundamental, podem ser paralelos (mesmo sentido de rotação) ou, com ainda mais baixa energia, opostos. A diferença de energia destes dois níveis é de
E = 6\times 10^{-6} eV= h\nu
Associado ao spin existe um momento magnético dipolar, já que trata-se de uma carga elétrica em movimento.
HI
A diferença de energia entre esses dois níveis corresponde a uma freqüência de 1420,4 MHz. Portanto, a transição entre esses dois níveis de estrutura hiperfina dá origem a uma linha de comprimento de onda de 21,049 cm.
\lambda=c/\nu=21,049 cm
A existência dessa linha foi predita, teoricamente, pelo dinamarquês Hendrick Christoffel van de Hulst (1918-2000), em 1944, e observada pelos americanos Harold Irwin Ewen (1922-) e Edward Mills Purcell (1912-1997) em 1951 (Nature 168, 356). Por causa da alta abundância de hidrogênio, apesar da longa vida média do estado
\Gamma= 3\times 10^{-15} s^{-1} \rightarrow \tau = 10^7 anos
esta linha é observada em todas as direções do céu. $\Gamma$ é chamado de largura natural do estado e $\tau$ o tempo de vida média deste estado, representando o tempo médio necessário para o decaimento espontâneo do nível ao estado de mais baixa energia. Estes parâmetros são conseqüência direta do princípio da incerteza de Heisenberg, que em termos de energia é escrito como
\Delta E \Delta t \leq \hbar
e identificamos $\tau\equiv \Delta t$ e $\Gamma \equiv \Delta E/\hbar$.
21cm
As partículas de poeira são suficientemente pequenas de forma que espalham (desviam a direção, sem absorver) a luz de menor comprimento de onda (luz azul) mais eficientemente do que as de maior comprimento de onda (luz vermelha).
avermelhamento
De fato, fótons azuis são desviados cerca de 10 vezes mais eficientemente do que os fótons vermelhos. Quando um fóton é desviado, sua direção muda aleatoriamente. Desta maneira, o espalhamento reduz o número de fótons azuis em relação ao número de fótons vermelhos do feixe de luz que vem em nossa direção. Para fótons no óptico, o espalhamento é proporcional ao comprimento de onda na potência -4.
Aλ=Ioλ-4
Como resultado, a poeira interestelar faz as estrelas parecerem mais vermelhas do que realmente são. Este efeito é similar ao que ocorre na atmosfera da Terra, onde as moléculas de oxigênio, de poluição e a poeira desviam a luz azul do Sol, tornando-o mais vermelho ao pôr-do-sol.
porsol
A poeira tem uma temperatura da ordem de 10 a 20K no meio interestelar, e chega a 100 a 600K em uma Região HII, que são regiões de gás hidrogênio ionizado em volta de estrelas quentes e massivas.

Regiões HII

As Regiões HII, nuvens de gás hidrogênio ionizado, ocorrem principalmente em volta de estrelas O e B pois estas emitem os fótons ultravioletas com energia acima de 13,6 eV, isto é, radiação com comprimento de onde menor que 912Å, tão energética que, quando os átomos de hidrogênio a absorvem, os elétrons ganham energia suficiente para se libertarem do núcleo, e o gás fica ionizado.
λmax/(912Å) = T/(32 000K)
Estas regiões portanto têm muitos íons de hidrogênio (prótons) e elétrons livres. Quando um próton captura um elétron livre, há emissão de radiação. As linhas do hidrogênio são emitidas quando o elétron passa, subseqüentemente, pelos vários níveis de energia. Desta maneira, os fótons ultravioleta da estrela são degradados em fótons no visível pela região HII. A radiação emitida quando o elétron passa do nível n=3 para o n=2, em 6563Å, é dominante e causa a cor vermelha da região.
Orion
Foto do centro da Nebulosa de Órion obtida com o Telescópio Espacial Hubble. Esta imagem cobre 2,5 anos-luz da nebulosa. Esta é a região HII mais famosa.
Trapézio
Imagem no visível (esquerda) e no infravermelho da região do Trapézio na Nebulosa de Órion, obtidas com o Telescópio Espacial Hubble, mostrando pelo menos 300 estrelas e 50 anãs marrons em formação e recém formadas. A imagem cobre um ano-luz.

Moléculas Interestelares

As primeiras moléculas interestelares foram descobertas em 1937 [Pol Swings (1906-1983) & Léon Rosenfeld, 1937, Astrophysical Journal, 86, 483], na forma de metilidina CH, CH+, e cianogênio CN. Hidrogênio molecular H2 foi descoberto no início dos anos 1970, junto com monóxido de carbono CO (2,6 mm, ou 115 gigahertz). Como o H2 não emite ondas de rádio, o CO é usado para mapeá-lo. Muitos outros tipos de moléculas têm sido encontradas desde então, desde amônia NH3, até as mais complexas como benzeno C6H6 e acetona (CH3)2CO e mesmo com 13 átomos HC11N cianodecapentano e C70 70-fulereno (Jan Cami, Jeronimo Bernard-Salas, Els Peeters, Sarah Elizabeth Malek, 2010, Detection of C60 and C70 in a Young Planetary Nebula, Science, 329, 1180). Baseado principalmente nas observações de CO, nota-se que as moléculas estão concentradas em nuvens moleculares, com massas de poucas vezes até um milhão de massas solares, e se extendem de alguns até cerca de 600 anos-luz. As estrelas se formam nas partes mais densas destas nuvens moleculares. Embora o hidrogênio molecular produza linhas no ultravioleta, o gás e poeira existentes nas nuvens moleculares torna a extinção ultravioleta muito grande, dificultando a medida do H2. Mas existem evidências de correlação entre a quantidade de H2 e a de CO, que pode ser medido em linhas de emissão de rádio em 2,6 e 1,3 mm.
O satélite infravermelho Spitzer encontrou hidrocarbonatos aromáticos policíclicos em uma nuvem remanescente de supernova, indicando que mesmo estas explosões energéticas não conseguem destruir estas moléculas complexas (Jeonghee Rho, Morten Andersen, A. Tappe, William T. Reach, Jean-Philippe Bernard, John Hewitt, 2011, European Astronomical Society, 46, 169).

Raios Cósmicos

O físico austríaco Victor Franz Hess (1883-1964) descobriu em 1911-1912 que partículas carregadas, principalmente prótons, chamadas de raios cósmicos, altamente energéticas, atingiam a Terra vindas do espaço. Os raios cósmicos são produzidos de alguma forma pelos processos mais energéticos no Universo, com energias trilhões de vezes maiores do que se pode obter em nossos laboratórios, e mesmo muito maiores do que as estrelas podem gerar. As partículas que constituem os ventos estelares, que dão origem às auroras na Terra, têm energia muito menor do que os raios cósmicos. A origem dos raios cósmicos mais energéticos ainda não é conhecida, mas explosões de supernovas e núcleos ativos de galáxias, com buracos negros centrais, são os mais prováveis. Hess, que fez medidas em balões que alcançaram 5000 metros de altura, recebeu o prêmio Nobel de 1936 por sua descoberta. Ao atingirem a atmosfera da Terra, estas partículas muitas vezes se desintegram em dezenas de outras partículas, causando os chuveiros de partículas.
raios cosmicos
Shower
Cálculo de um chuveiro de partículas calculado pelo grupo Cosmus do projeto Pierre Auger.

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