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terça-feira, 2 de julho de 2013

Estudo virtual do centro da Terra

Estudo virtual do centro da Terra

Pesquisadores reproduzem, por meio de modelos computacionais, condições termodinâmicas a que os minerais estão expostos no manto inferior.
Terremotos como o ocorrido na semana passada no Chile e o que destruiu o Haiti em janeiro são importantes fontes de informação para os geofísicos. Os dados registrados durante os tremores servem não só para os estudos dos abalos em si como também para tentar conhecer melhor o centro da Terra.
Ao ser medido do outro lado do planeta, por exemplo, o tremor em terras chilenas pode ajudar a descobrir a constituição do centro terrestre por onde essas ondas sísmicas passaram.
A fim de ampliar as fontes de informação sobre o assunto, um Projeto Temático iniciado no dia 1º deste mês, apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), pretende investigar nos próximos três anos a composição do centro do planeta sem necessitar da ocorrência de abalos sísmicos.
Os pesquisadores ligados ao projeto, intitulado "Simulação e modelagem de minerais a altas pressões", reproduzirão por meio de modelos computacionais as condições termodinâmicas a que os minerais estão expostos no subsolo terrestre.
As dificuldades de se estudar o que ocorre no chamado manto terrestre inferior, que compreende profundidades entre 670 e 2,7 mil quilômetros, pressões entre 20 e 130 gigapascais e temperaturas que chegam a 2000º Kelvin, fazem os cientistas lançar mão de medidas indiretas, como as geradas pelos abalos sísmicos.
"Só para se ter uma ideia, a camada pré-sal do oceano na qual o Brasil vai explorar petróleo compreende profundidades de cerca de 7 quilômetros. Isso mostra que conhecemos somente a casquinha do nosso planeta", comparou João Francisco Justo Filho, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Temático.
Especialista em modelagem de materiais e em nanossistemas, Justo Filho começou a se interessar por geofísica em 2007, quando atuou como pesquisador visitante na Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos.
Na época, notou que não havia muitos estudos teóricos de materiais submetidos a altas pressões e passou a analisar a influência da pressão no magnetismo.
Uma das hipóteses que a nova pesquisa deverá testar é a dos efeitos das transições dos materiais de um estado magnético para um estado não-magnético. Justo Filho especula que a viscosidade deva sofrer um grande efeito como consequência dessas transições, ou seja, à medida que o material amolece também perde seu magnetismo.
Ao aplicar essas hipóteses em um sistema altamente dinâmico, como é o centro da Terra, o grupo espera correlacionar as propriedades às possíveis combinações de elementos, como ferro, magnésio e oxigênio, que ocorrem nas chamadas áreas de recombinação química.
O grupo testará modelos geofísicos computacionais baseados em medições indiretas como a de abalos sísmicos e da radiação térmica de corpos negros. Este último método é uma ferramenta da astrofísica que consiste no registro da radiação captada na superfície de um corpo, no caso a Terra, e emitida pelo seu interior. Essa medida permite inferir por onde passou a radiação ao analisar sua trajetória desde o núcleo até a superfície.
Um dos objetivos da pesquisa é a elaboração de um mapa de correlação entre temperaturas e profundidades das várias camadas do planeta. "Essa ainda é uma questão em aberto no estudo do manto inferior terrestre", disse Justo Filho.

Coração de ferro

Não há como estudar o centro da Terra sem abordar um dos elementos mais abundantes do núcleo incandescente, o ferro. Mas sua concentração ainda é uma incógnita para a qual o Projeto Temático tentará levantar pistas.
O interior do planeta contém primordialmente minerais do tipo óxidos, como o óxido de magnésio e o silicato de magnésio, e várias questões a respeito da incorporação do ferro nessas estruturas permanecem em aberto.
O magnetismo terrestre, que faz o ponteiro magnetizado de uma bússola apontar para o norte geográfico da Terra, é atribuído à presença do ferro na composição do planeta.
Por sua vez, as propriedades magnéticas desse mineral estão relacionadas ao seu número spin, o qual também sofre alterações motivadas por temperaturas e pressões diferentes, segundo explica a professora Lucy Vitória Credidio Assali, do Instituto de Física da USP, que também participa do Temático.
"O magnetismo terrestre pode estar associado a essas mudanças ocorridas no interior do planeta", disse. O projeto de pesquisa permitirá a execução de simulações computacionais dispensando a necessidade de experimentos físicos realizados em laboratório.
Ensaios de minerais a altas pressões exigem equipamentos caros, como células de diamantes, que espremem amostras para medir suas propriedades físicas. Além disso, esses testes possuem limitações e não abrangem as interações que ocorrem entre os minerais no interior do planeta.
Os modelos computacionais também poderão levar à descoberta de novos meios e ferramentas para se chegar a respostas sobre dúvidas a respeito dos mecanismos internos do planeta. "Poderemos verificar alternativas e descobrir caminhos para se obter outros resultados, algo permitido pela simulação computacional", disse Lucy.
Com as simulações, os pesquisadores esperam aprofundar os conhecimentos sobre a composição química do manto terrestre, a geo e termodinâmica do planeta e a evolução das placas tectônicas, informações essenciais para o melhor entendimento dos terremotos.

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